CORPO, GÊNERO E PODER NA LITERATURA.


                                                                                                                                             


Bruno João Cá e Eusébio Djú
Orientadora Profa. Dra. Luana Antunes Costa


            Este trabalho debruça-se sobre a análise crítica do discurso feminino presente no filme documentário “25 de julho- o filme: Feminismo negro contado na primeira pessoa”, fazendo uma relação com os textos em estudo de Nilma Lino Gomes e Ina Kerner e o vídeo da Djamila Ribeiro: referindo-nos nomeadamente das obras, “Corpo e cabelo como símbolos da identidade negra”, “Tudo é interseccional? Sobre a relação entre racismo e sexismo” e “Feminismo Negro e Filosofia - Djamila Ribeiro Mulheres na Política”. Para tanto, mostraremos à convergência nas falas das mulheres que foram entrevistadas no filme documentário, assim como, apresentaremos a formação discursiva que elas elaboram e o que elas pretendem alcançar mediante os seus discursos, mas também, faremos um diálogo mais profundo com o vídeo da Djamila Ribeiro, bem como, os textos indicados, anteriormente. 
             Dedicando-nos, a partir, daqui, a essa análise. Ouve-se nas falas de cada mulher entrevistada um discurso da desestereotipação, talvez, poder-se-ia entender que tivesse tudo escrito no papel para depois exprimir isso oralmente. Já que, há uma convergência ideológica maior. Pois, no fundo, percebe-se que cada mulher entrevistada no vídeo pertence a um lugar ou um espaço específico, periferia de São Paulo.  Fato que ela deixa os seus discursos com uma certa heterogenia, não obstante, essa heterogeneidade se interlaça nos pontos focais que cada uma delas enaltece, ou seja, a convergência de opiniões se dá quando ambas falam sobre a opressão racista, sexista e de classe que assola a vida individual de cada uma delas.
Compreende-se que, essas mulheres carregam nas suas falas um discurso da militância e de um engajamento político, falando, especificamente, da política, nesse caso que extrapola a luta de viés partidário, mas sim, a partir de uma tomada de consciência sobre algo que necessita, com muita urgência, ser combatido e repudiado na sociedade. O paradigma social construído em que o sistema oprime e torna refém a figura da mulher, faz com que a tomada de consciência de cada mulher seja mais clara e frontal. No entanto, sabendo que o obstáculo é enorme, essas mulheres delineiam estratégias esperançosas de que tudo pode ser mudado. Para tanto, é necessário levarmos em conta que, a fala de uma das mulheres entrevistadas que coloca que “a militância e ou o ser feminista é sair armada na luta todos os dias e sair na construção”. Buscando lobrigar a fala dessa mulher militante do feminismo, é interessante perceber que, o fato de sair armada pressupõe uma preparação de antemão para as companheiras, fato esse que vale ressalva, dado que, a luta para uma inversão de paradigma, pressupõe uma formação que deriva de bandeiras a serem defendidas para cada luta feminista em particular. Pois, somente, assim serão capazes de transformar e construir um novo paradigma mais igualitário e justo, sem sequelas de opressão seja a de classe, gênero e raça.
Indo mais ao fundo nesta análise, é interessante ressaltar que, o discurso das mulheres entrevistadas no vídeo autorretrata um perfil feminista que mostra uma consciência, do passado histórico, construída sobre a figura do corpo negro e feminino em particular. Com isso, queremos mostrar que, embora a empreitada seja árdua, mas funciona como uma tomada de consciência, possibilitando melhor o entendimento dessas marcas de opressão construídas sobre o corpo feminino negro desde colonialismo e que, atualmente, ainda opera com muita evidência e fervor na sociedade brasileira, colocando estereótipos e discriminando a mulher negra, em particular a mulher negra pobre e periférica, que muitas das vezes é vista pela lente do estereótipo como mulher acessível, sempre disponível e dotada de uma sexualidade voraz.
Embora o destaque no campo social brasileiro tenha sempre um rosto masculino, a mulher negra não se deixou sucumbir a esse demônio opressivo, não é à toa que a mulher negra é a dona de casa, é quem coloca o pão na mesa, ela trava uma tripla jornada a entender, a ser mãe, a de ser trabalhadora e a de ser estudiosa para inteirar sobre os problemas que são inerentes a ela. Tal como, assevera Kerner (2012), uns dos problemas que as mulheres negras enfrentam na sociedade pode se destacar sexismo e racismo que foram os termos criados a partir da metade dos anos 1960 que são, hoje, na sociedade atual, muitos nítidos. Pois, o racismo e o sexismo incorporam falsas suposições a partir de um mito, sem fundamento evidente. Levamo-nos em conta a esses problemas que as mulheres negras enfrentam, é pertinente demonstrar que, essa construção ideológica não passa de um impacto com os estereótipos latentes no passado do que foram às mulheres negras no passado. Isso também, se passa da mesma forma com os negros, se formos entender o pensamento de Nilma Lino Gomes no texto “Corpo e cabelo como símbolos da identidade negra”. Para Gomes (2016), há imagens construídas a partir do passado histórico do negro, “o negro, a ideia de labuta, sofrimento e fadiga faz parte de uma história ancestral. Remete à exploração e à escravidão”, (GOMES, 2016, p. 08). Com isso, ficam-se evidentes as pretensões das vozes das feministas negras periféricas que lutam em busca de uma construção de sociedades mais justas e igualitárias. Da mesma forma, que podemos ver o filme documentário “25 de julho- o filme: Feminismo negro contado na primeira pessoa” se debate as estratégias de luta, desde valorização e de cultuação de algumas datas que são marcos na luta de tomada de consciência feminista, sobre o que é ser mulher negra latina americana e caribenha, nesse caso específico a data de 25 de junho, em que se comemora um marco histórico na mobilização de mulheres desses países, que se juntaram para debater formas de lutar conta à opressão machista, sexista e racial que as afetam enquanto uma categoria social. Podemos compreender que, de certa forma, as feministas de todo mundo, em particular, as feministas negras brasileiras, partiram de que “O cabelo crespo na sociedade brasileira é uma linguagem e, enquanto tal, ele comunica e informa sobre as relações raciais”, GOMES, 2016, p. 09). Sendo assim, o filme documentário, anteriormente destacado, é bastante proveitoso, desta forma, porque, ajuda a quebrar estereótipos e tabus enraizados há anos na sociedade contra a figura ou o corpo da mulher negra visto como o da promiscuidade, sempre disponível como um objeto sexual e de prazer do homem machista opressor. Não poupando esforço, essas meninas, personagens do filme documentário, criam saídas e chamam mulheres a saírem à luta contra a opressão masculina, social, sexista e racista que assola e oprime cada vez mais e deixa vulnerável a camada feminina e, que atinge também os homens negros de forma violenta, caracterizando-os também de forma estereotipada.
Nesta ótica, percebe-se que as mulheres negras entrevistadas no vídeo documentário, afirmam que as mulheres negras no passado histórico, individualmente, desde que se possa entender, foram as bases ou alicerces de qualquer família, sendo alicerces, as suas presenças não devem ser ignoradas, mesmo que o machismo as subjuga, mas elas foram e sempre serão as progenitoras como também  construtoras de um novo mundo e nova história, pois, compreende-se que elas que travam uma luta contra a hegemonia e buscando a afirmação de um novo paradigma, à concessão de direitos iguais a todas as mulheres negras brasileiras.
A luta empreendida pelas mulheres negras para a mudança do paradigma é sentida também em toda a parte do mundo, ainda pode-se perceber que, “na atual discussão europeia, o termo “intersecções” serve como símbolo para todas as formas possíveis de combinações e de entrelaçamentos de diversas formas de poder expressas por categorias de diferença e de diversidade, sobretudo as de “raça”, etnia, gênero, sexualidade, classe/ camada social”, (KERNER, 2012, p. 55). Logo, tantas afirmações das mulheres negras militantes do feminismo entrevistadas no vídeo documentário fazem compreender nas suas falas um alinhamento do discurso para um fim maior e mais uniforme em busca em igualdade de gêneros, raças, etnias, sexualidades, classes/camadas sociais. Tal como, pode-se compreender numa entrevista da Filósofa, Djamila Ribeiro, onde ela aborda a temática do feminismo negro e filosofia. Ela referencia na sua fala à Ângela Davis, a partir da sua obra “as mulheres negras na construção de uma utopia” a obra publicada em 2011 e Bell Hooks “intelectuais negras”, mas também, ela traz à tona uma problemática muito importante quando indica a Audre Lorde. Ela assevera que ao ver-se colocada à escolha de lutar contra o racismo e sexismo, afirma que não tem como eleger uma como mais importante “eu sou mulher e negra, não posso escolher sobre quais formas de luta à opressão, porque todas me atingem”, (RIBEIRO, 2016). A participação da Djamila Ribeiro num evento na USP para discutir a relação das mulheres na filosofia. Ela presenciou uma aluna falando que, elas, no todo, têm dificuldades em levantar a mão para fazer uma pergunta e falar dentro da sala de aula, enquanto que, alunos estão a vontade para falar, mas que eles estivessem a falar à toa, mas são privilegiados, entretanto, as alunas não tiveram o mesmo privilégio, (RIBEIRO, 2016). 
Isso que foi dito pela Djamila Ribeiro é compreendida também por Kerner (2012), quando, ela, na sua explanação sobre o feminismo negro, afirma que o racismo e do sexismo têm uma dimensão epistêmica que está relacionada a discursos e saberes, mas também contêm símbolos e imagens, (KERNER, 2012, p. 56). “A dimensão institucional diz respeito a arranjos institucionais que produzem formas estruturais de hierarquização e de discriminação”, (KERNER, 2012, p. 56). Num entendimento maior a partir desta indicação das ideias da autora, é necessário vislumbrar que há discurso machista vigente nas instituições sociais, mercado de trabalho, escola, universidade entre outras instituições sociais, aqui, não foram expostas. Mas também, de acordo com Kerner (2012), há outra dimensão do racismo e sexismo, segundo ela, dita à dimensão pessoal, visto que, diz respeito a atitudes, mas também a identidade e a subjetividade de pessoas tanto daquelas que pertencem a grupos sociais com status de maioria no que se refere ao racismo e ao sexismo, quanto daquelas que podemos atribuir a grupos minoritários, (KERNER, 2012, p. 56).
Para tanto, fazendo entrelaçamento com o que foi percebido nos textos estudados e nos vídeos assistidos, podemo-nos afirmar que, as formas do discurso, muitas vezes são rebuscadas a partir do dito já conhecido, tal como, entendemos nas falas das mulheres negras periféricas presentes no documentário: “25 de julho”, textos estudados de Nilma Lino Gomes e Ina Kerner e também o vídeo da Djamila Ribeiro, as formações imaginárias se manifestam, no processo discursivo, através da antecipação, das relações de força e de sentido. Na antecipação, o emissor projeta uma representação imaginária do receptor e, a partir dela, estabelece suas estratégias discursivas. O lugar de onde fala a mulher negra periférica determina as relações de força no discurso, enquanto as relações de sentido pressupõem que não há discurso que não se relacione com outros. O que ocorre é um jogo de imagens: dos sujeitos entre si, dos sujeitos com os lugares que ocupam na formação social e dos discursos já-ditos com os possíveis e imaginados, enquanto que mecanismos de funcionamento discursivo, não dizem respeito a sujeitos físicos ou lugares empíricos, mas às imagens resultantes de suas projeções.













REFERÊNCIA
25 de julho- o filme: Feminismo negro contado na primeira pessoa. São Paulo, 2013.
Feminismo Negro e Filosofia - Djamila Ribeiro (Mulheres na Política). Disponível em (https://www.youtube.com/watch?v=u56gUXbdH2Q): acesso no dia 10 de Novembro de 2016.
GOMES, Nilma Lino. Corpo e cabelo como símbolos da identidade negra.
Belo Horizonte-MG, 2016.

KERNER, Ina. Tudo é interseccional? Sobre a relação entre racismo e sexismo, 2012.

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